28/02/2010

Ou não!


Essa semana encontrei uma pessoa que frequentemente usa a expressão "ou não!" após alguma afirmativa que demonstre projeção, planos a serem executados. A expressão que vem em seguida dá uma instabilidade à frase anterior, indeterminando o prazo de realização do plano ou mesmo desacreditando que ele possa ser realizado. Relacionar-se com alguém que após cada frase utiliza a expressão "ou não!" gera uma enorme crise de confiança no cumprimento dos pactos.
Lembrei-me que a expressão "ou não!" era muito usada pela juventude no período em que a ditadura militar estava no poder. Naquele contexto o uso dessa expressão se justificava uma vez que o futuro dos jovens era incerto com tanta repressão estatal e violação de direitos humanos. Se os jovens têm na capacidade de sonhar e vontade de realizar seus projetos sua maior força, a força da juventude ficava mitigada pela incerteza dos anos por vir e pela percepção de que outros jovens estavam "desaparecendo" ou sendo executados em nome da ordem. Aquela juventude usava o "ou não!" como instrumento de denúncia da realidade social daquele tempo, como quem dizia: "se a ditadura militar permitir (se ela não me assassinar) farei isso ou aquilo".
Mas nos dias de hoje, o uso do "ou não!" cria uma insegurança descontextualizada, já que vivemos num cenário em que não há mais supressão dos direitos de liberdade. Isso significa que nos dias de hoje, mais poderoso do que o "ou não!" denunciativo do período da ditadura militar é outra expressão cunhada e cantada naquele mesmo periodo: "quem sabe faz a hora, não espera acontecer".

27/02/2010

Pensar e agir

Pra que agir sem pensar?
Por que pensar se não vai agir?
Por que pensar, senão agir?
Agir.
Agitar.
Vamos lá!

Aja!
Pra já!
Venha cá.
Sai pra lá.

Pensar e agir
Não se dão,
Estão sempre na contramão.

Pensar e agir é
Pra não macular a reta.
Pra atingir a meta.
Meta
E para de pensar.
Porque quando o inverno chega
A água congela na torneira.
Aí não dá.

26/02/2010

Frase de efeito

A frase é feita pra durar.
A frase de efeito perdura.
Às vezes, a frase de tanto efeito
É feita com defeito.
E o defeito dela é que seu efeito
É arbitrário.
Fazendo efeito contrário.

Parafraseando uma frase feita qualquer,
Defeito nos olhos dos outros é humano.
Porque quem com ferro duro,
Dura para sempre.
Que efeito pode ter uma frase que não diz nada?
Mas quando uma frase diz alguma coisa...
Vamos à luta!

Leia a frase e experimente seu efeito.
Olhe as crianças e pense no seu defeito.
Feito?

25/02/2010

Estátudoaíésójuntaroscacosecome-los

Escrevo esse texto de um fôlego só sem pontos nem vírgulas para assemelhar-se à propria caoticidade da vida e para que você mesmo decida onde deve parar para respirar e continuar se é que isso dá se é que se pode na vida parar já que a aceleração das experiências cotidianas parece retirar de nós o poder da escolha se é que ainda temos se é que vemos se é que agimos porque parece mesmo que nessa vida atual só nos é permitido reagir sobreviver padecer e carecer pra depois morrer ouentãoacelerarparaacompanharoritmoloucodessemundoderelaçõessuperficiaisedescartáveisdaqualanossarelaçãoémaisumadessastantasqueseperdememegoísmosevaidadesemtemoreseinvejasporqueestamossubmetidosàlógicadarelaçãoinstantâneaefugazemquenosexpomosedesejamosnummsnrealemquetemososamigosalienãosabemosseostemoseescrevemostudoerradoparanãoperdertemponemdeixarooutroesperandomaisumbanalkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkpelamadrugadaadentrodasnossascabeçasondeestãopousadasasborboletascoloridasdeRedmond CHEGA!
Não sou desse mundo.

24/02/2010

Tudo muda, em algum lugar

Um dia desses as coisas mudam.
Em algum lugar as coisas mudam.
Não sei se pra melhor,
Não sei se pra pior.
Mas mudam.

Alguma coisa pode mudar.
Vinte e um dia desses a coisa muda.
Ou não!

Mas o que importa não é a mudança.
O que muda não importa.

Se eu falar o que muda
Estrago o segredo
Mas falar o que importa,
Morro de medo.
E a responsabilidade luta
Com a necessidade.
E a ansiedade.

Essa luta é terapeutica.
Cobre lacunas
E abre feridas.
Rasga o peito e esvazia a alma.

Mas a libertação que está próxima
Pode não chegar.
Pode se tornar prisão.
Mesmo que uma outra prisão.

Cruze os dedos
Que as coisas mudam.
Trabalha por isso,
Que as coisas mudam.
Não sei se pra melhor
Ou pior.
Mas o novo é sempre mudança.
E a mudança é sempre uma novidade.

Abre os olhos e vê o que muda!
Abre os olhos e vê a muda!
Abre os olhos e vê se se muda!

21/02/2010

Árvore da Vida


Árvore gigante e frondosa da vida

Com sua folhagem arredondada
Como um chapéu na cabeça de um palhaço magricela
Seu caule largo ninguém pode abraçar.
Lança a semente da vida pelo ar.
E dissemina a vida em outro lugar.
A ameaça vem descendo.
Proteja, do corte afiado, seu vigor
Do vai-e-vem frenético
Que busca derrubar.
Com quanta alegria se realiza a dor!
Quanta dor para produzir alegria!
Não troque sua vida pela produção.
Isso é sacanagem.

18/02/2010

Rodando por aí


Andar de bicicleta pode parecer tão banal,
Mas há aí algo sobrenatural:
Ninguém consegue levar a vida rodando por aí.
Todos vivem a vida rodando por aí,
Como quem anda de bicicleta.
E se parar vai cair,
E pra parar tem que reduzir.
Ou precisará botar os pés no chão.
E não há nada pior que botar os pés no chão,
Que reconhecer a segurança na terra-firme.
A terra-firme pode ser ilusão.

Andar de bicicleta é como viver a sonhar
Ver tudo passar rápido o suficiente para não se apegar
Ver tudo passar não tão rápido assim,
A ponto de poder, pelo menos, apreciar.
Mesmo sem se envolver.
Não quero mesmo me envolver.
Desejo muito me envolver.
Penetrar um mundo novo.
Suar,
Cansar,
Viajar
E continuar.

Andar de bicicleta é melhor que viver.
Andar de bicicleta é viver.
Viver com aventura,
Com emoção.
Viver, rodando por aí, é melhor que viver com o pé no chão.
É ousadia,
É projeção,
É cansaço e
Satisfação.

Usa menos o freio
E mais imaginação.
Sobe e desce.
Vem e vai.
Roda por aí.
E vê se não cai.
Mas se cair, não tem problema,
Levanta e vai.

17/02/2010

A massa

Na massa estão os ingredientes.
Todos eles.
Cada um deles.
Misturados com carinho
E com muita força.
Estão todos lá
Escondidinhos
Juntinhos
Formando uma coisa só.
Um mistério!

A massa pode ser de bolo
Ou pode ser torta;
Pode ser salgada
Ou melada;
Pode ser leve
Ou pesada.
Lá estão os ingredientes.
Nas medidas exatas
Ou erradas.
O sal
E o açucar.
A pimenta
E a canela.
A água fria,
O calor,
O vapor,
O trigo,
Um ovo
E de novo.

E aperta
E amassa,
Amassa
A massa.
E soca,
Bate,
Alisa.
Mais trigo.
E força nas mãos:
Sem pressão não há criação.
E tudo fica misturado.
E o resultado é maravilhoso:
Juntos são uma coisa nova,
Mesmo de maneira disfarçada.
Mas eles convivem bem.
Porque se isso não acontece,
A massa desanda.

Quantos segredos se escondem numa massa?

16/02/2010

Parceria com o Criador


O rude.
O tosco.
O bruto.
Quanta beleza há aí!
É preciso muito talento
Pra lidar com a matéria-prima.
Ela pode ser modificada pelo artesão.
Mas também pode modificar o artesão.

O trabalho humano quando respeita os contornos naturais
Melhora a própria natureza,
Valoriza o original.
E o artista vê sua arte integrada à natureza.
Artista e Criador tornam-se um,
Trabalham juntos:
Trabalho coletivo entre artista e Criador.

A tora.
A rocha.
O látex.
O couro.
Não importa o material.
Ele é melhorado pelo artista para atender o espiritual.

A arte é a reunião da inspiração divina
Com a transpiração humana.
E é mais divina que humana.
Mas diviniza o Homem
E humaniza a Divindade.
E nos entendemos nesse patamar intermediário que chamamos
Gosto.

15/02/2010

Muitos braços e solidão

Quantos braços são necessários para 1) abraçar, 2) cuidar, 3) acariciar, 4) pegar, 5) despedir, 6) carregar, 7) balançar, 8) criar...? E de que adiantaria fazer tudo sozinho, sem ter com quem dividir?

14/02/2010

Roda de carnaval


Mais um carnaval.
São tantos carnaváis!
Quantos carnaváis?!
Mas cada um deles é apenas mais um.
Carnaval de verdade é hoje.
Momento de subversão.
De transgressão da ordem.
De uma ordem que deveria ser mais transgredida cotidianamente,
Já que enfadonha, cansativa, desigual e injusta.
Precisamos de mais carnaváis,
De mais subversões.
De mais gozo.
A cada semestre.
Ou a cada trimestre.
Ou a cada mês.
Semanalmente.
Ou diariamente.
Sei porquê o carnaval brasileiro é tão rico.
É que nossas opressões são mais intensas
E descontamos tudo na plasticidade do nosso gingado
E de nossa festa carnavalesca.
É o nosso desabafo.
O nosso grito de insatisfação
Que apresenta uma nova possibilidade,
Leve, bela e alegre.
Poesia pura.
Mas como o carnaval é uma válvula de escape,
Não o levamos a sério.
Não o suficiente
Para gerar mudanças permanetes.
Suspendemos a lei da moral por três dias,
Talvez por uma semana,
E nos libertamos.
Passado esse tempo,
Voltamos à rotina de opressão.
E aí suspendemos (ou usamos) a lei legal para dar cabo à exploração.
Para por em prática nossa moral de favores, de conchavos,
De acordos.
Acordamos assim
Cada dia,
Todo dia.
Menos no carnaval.
Ah, o carnaval!
Mais um carnaval.
São tantos carnaváis?!
_________________
A forma não é sempre a fôrma do conteúdo. Por vezes a forma é mais, é o próprio conteúdo. Mesmo que ela (a forma) pareça deformada.

12/02/2010

Feedback


Quando recebo um retorno positivo e inesperado encho os olhos de lágrimas. Saber que alguém fez questão de falar comigo por algo que fiz sem saber, ou sem querer, é uma experiência única. Impressionantemente emocionante. É algo como ter cumprido uma missão. É experimentar a sensação de ter sido instrumento para realização de alguma coisa que não estava em mim, que eu não era capaz de produzir. E pior é que dá vontade de continuar fazendo o melhor que puder. Mesmo sabendo que não posso fazer o melhor, que não sei realiza-lo. Mas pela adorável sensação de ouvir um "muito obrigado!", de receber um feedback.

11/02/2010

Cenoura


De tanto comer cenoura
Fiquei com a pele alaranjada.
De tanto comer cenoura
Fiquei com hálito de coelho.
De tanto comer cenoura
Sofri com prisão de ventre.
A conclusão a que chego é que cenoura demais faz mal.
E que preciso variar a alimentação.

10/02/2010

Confuso, esperançoso ou agressivo



Há coisas na vida que desejamos sem poder experimentar.
E há coisas que experimentamos sem desejar.
Há experiências que são impossíveis.
E há as que não nos permitimos.
Quero fazer o que não posso.
Posso querer o que não faço.
Penso em contradições.
Vivo como penso.
E não sei se isso deve ser diferente.
E nem sei se há outra maneira de ser.
Mas sugiro uma vida pensada.
Mas pretendo um pensamento vivo.
O que gostaria é de uma vida calma.
O que gostaria é de um pensamento novo.
Mas sem eliminar o que na vida há de melhor:
A possibilidade de resolver puzzles cotidianos.
Ou mesmo de passar adiante.
Pois não há demérito em perder.
Não há nada errado em não saber.
Eu mesmo já imaginei saber.
Eu mesmo já soube imaginar.
E quer saber,
Não vi motivos para não continuar
Tentando,
Errando
E acertando.
Qual o problema de aproximar-se do fim?
A vida pode estar no fim.
Ou o fim pode não estar ali.
Mas o que importa se não chegamos a lugar nenhum?
A quem importa desejarmos o impossível
E vivermos o indesejável?
O problema é particular.
O particular não é problema.
Quem disse que a vida acabou está errado.
Quem acha que o tempo se esvai está enganado.
A vida não é uma grande tentativa tentadora de acertar?
Se essa vontade se mantém
A vida vai além.
Mas quando a bomba para de bombear
A vida não está mais lá.
Você tem dificuldade de entender o que digo?
Talvez seja mesmo complicado e sem sentido.
Ou talvez não seja pra você.
Passe adiante.
Passar bem!