31/08/2012

Resposta a um certo soneto de Vinícius

E de repente nem se está ausente.
Pode ser presente,
Futuro reticente.
Mas só se o diálogo for diferente,
Se aprenderem a ser gente.
E nunca indiferente.
Que sejam amantes,
Errantes,
Inconstantes
E perdoantes.
Que sejam livres,
Que sejam leves,
A ponto do vento levar.
E voem para algum lugar.
Não deixem de arriscar!
Sem grudar,
Sem cobrar,
Sem pensar
Onde se vai chegar.
A graça está sempre em caminhar,
Ou voar.
E quando se quiser parar,
Que, então, se pare,
E, então, separe!
Não há culpa para quem entende o momento
E respeita seu próprio sentimento.
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Em homenagem aos amigos Thiago e Sabrina. Agosto de 2013.

25/08/2012

Novas relações familiares

Temos outras famílias. As mesmas, mas com maior liberdade individual interna, autonomia. E com um prazo de validade menor. As novas relações familiares não são pautadas mais, necessariamente, no casamento. O que não significa dizer que o casamento esteja em vias de extinção, ele mesmo vai modificar-se para sobreviver.
Por exemplo, um problema clássico das relações afetivo-amorosas é a infidelidade, que sempre coloca em cheque a própria relação. Hoje o controle social é digital/virtual/tecnológico e mais intenso que no passado. Meus avós e meus pais eram controlados pelos parentes e amigos de forma direta. Nós, por nem sabemos quem: "sorria, você está sendo filmado". Hojé há mais locais pagos destinados ao sexo. No passado, as relações extra-conjugais aconteciam com certa naturalidade e discrição. Vez ou outra alguém era flagrado num carro em lugar distante e deserto ou numa praça escura da cidade. Hoje as praças estão cercadas com grades e em suas redondezas a criminalidade e o consumo de drogas se instalaram. Lugares distantes já nem existem mais, embora o deserto tenha invadido nossas vidas. O deserto do real, que é angustiante e deseperançado. É o hoje como categoria existencial imperativa. E se não aproveitar, vira passado.
As famílias no Brasil foram, historicamente, tolerantes com relações extra-conjugais. Havia um consórcio entre Casa-Grande e Senzala, como diria Gilberto Freyre. A miscigenação é expressão clara de uma mistura racial que expressa também uma mistura social, uma mistura de classes que acontecia, em grande parte, fora do casamento. Hoje, como o controle social é mais intenso e eficiente e o diálogo sobre a qualidade da relação é mais constante, os cônjuges (ou companheiros) vão se tornando mais intolerantes às infidelidades e, por consequência, os casamentos vão se encurtando e se multiplicando. Ninguém mais quer viver aqueles antigos casamentos de fachada. Hoje a gente faz um rígido controle de qualidade da relação. E se não estiver funcionando bem, é reprovada e descartada, assim como os aparelhos eletrônicos hoje em dia. Não é o fim do casamento, haja vista que as pessoas se casam mais vezes ao longo da vida, mas uma reinterpretação do "até que a morte os separe". A vida útil do casamento encurtou.
Os filhos dos casamentos de hoje estão muito mais adaptados a essa nova realidade que as gerações mais antigas. O resultado é um conflito geracional quanto à visão sobre as novas relações familiares: os mais velhos acham que piorou e os mais novos, que agora é melhor.
Não há saudosismos aqui. Só constatações de mudanças nas familias brasileiras. São só mudanças. E você, o que acha?
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Na imagem, meus antepassados por parte de mãe, em foto tirada no início do século XX, provavelmente em Macaé/RJ. Ao centro, sentado, um dos pioneiros da família no Brasil, Robert (Bob) Reid.

24/08/2012

Excesso é uma droga!

Por muito tempo usei drogas,
Agora elas me usam.
E não sei onde vou parar.
Excesso é uma droga!

23/08/2012

Clima

Quando nuvens se aproximam,
Carregadas por você,
Abro minha caixa d'água,
Esperando chover.

Quando relâmpagos fotografam,
Minha cara de saudade,
Minha vontade de você,
Fico cego um momento,
Aguardando seu ruído.

E quando você chega na minha terra,
Molhando minha secura,
Adoçando minha amargura,
Faço lama com os pés
Para deitarmos e rolarmos.

22/08/2012

Dentro e fora

Vai lá fora ver se chove.
Aqui dentro está tudo molhado.
E nem sei nadar.

Vai lá fora ver o que se passa.
Aqui dentro, nada passa.
E não sei sair.
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Dentro e fora podem ser dois lados de uma mesma moeda: a porta pela qual se entra é a mesma pela qual se sai. Quando estamos dentro, vemos de forma idealizada o que está fora; já quando estamos fora, idealizamos o lado de dentro. Não há problema em idealizar. O problema está em não viver. Idealizar é humano! Permanecer no erro, desumano.

21/08/2012

Víbora é a mãe!

Um livro bom é aquele que nos faz perceber de modo diferente o que já achava que conhecíamos. Encontrei Hervé Bazin, pensando o que sinto. Numa das passagens do "revoltado" livro "De víbora na mão" (Vipère au Poing), seu primeiro livro, há uma frase ontológica: "Existe lugar melhor pra uma pessoa do que na família? Em qualquer outro lugar!"
E não é?

20/08/2012

Fácil e errado

As vezes fazer o errado é mais fácil.
Porque sei o que é o fácil,
Mas não o errado.
Ah, se você soubesse como sofro por fazer o fácil,
Por fazer você sofrer!...
Queria saber cuidar de você!
Mas só sei o fácil.
Porque difícil sou eu.
E erro fácil!
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Pedra Azul, 2011.

19/08/2012

Carro

Carro como movimento,
Símbolo de fluxo:
Des-lo-ca-men-to.
Entro no seu carro,
Entro na sua vida,
Meto-me em você;
Saio do seu carro,
Saio da sua vida.
E por ai vai.
Às vezes entro no carro em movimento;
Às vezes nem me movimento,
Nem preciso falar.
As marcas vão demonstrar
Nossa viagem:
Velocidade,
Incompatibilidade.
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Pedra Azul, 2011.

18/08/2012

Só me falta o que não tenho

Não tenho paz,
Não tenho beleza,
Não tenho dinheiro...
Mas trabalho,
Não tenho falta.

17/08/2012

Ataques

É legítima sua auto-proteção,
Como meu excesso.
E não me enxergo
Sem atacar você.
E quanto mais eu avançar,
Mais você vai recuar.
Mas ao fim da estrada não há fim.
E encosto você contra a parede
Pra ver se consigo derruba-la.
Espero o dia.

16/08/2012

Seu carrasco é você

Seu coração inda palpita quando me vê?
E quando sumo,
Ele para de bater?
Você não merece todas essas batidas,
Tantas feridas.
Você precisa correr!

15/08/2012

Dor

Quando a dor se instala
Nada acalma a alma.
E se alguém promete aliviar,
Terá de se esforçar,
Pois se não remediar,
A dor será intensa,
Será imensa.
Bem maior que você.

Mas aquela dor no peito,
Não tem jeito,
Ainda vai matar você!
Cuida do seu amor.

14/08/2012

Gênero de amor

Chegou o tempo certo
De fazer tudo errado,
De embalar nossas almas
E embolar nossas coxas.
É preciso fechar os olhos
Pra viver.

13/08/2012

Veloz!

Corro solto pelas curvas arrojadas,
Sem sinto.
E caio na estrada
Atrás de você.
Nem ouço o galo cantar
E já me vou.

12/08/2012

Papai Dé

Papai Dé um dia se foi
Sem cumprir sua missão.
É sempre assim:
Quem fica nunca se prepara para o fim.
E quem vai,
Mesmo que não se prepare,
Nunca sabe que chegou o fim,
Continua a sonhar,
Como se estivesse vivendo.
Papai Dé
Ficou até em pé
De guerra,
Pra defender as crias
E ser seus guias
Por um tempo apenas
Papai Dé
Fez o melhor que podia,
Todo dia.
Fez até poesia.
Mas tudo nunca é o bastante.
Papai Dé já não é
Como era antes,
Mas continua sendo
Alguma coisa vivendo
Em você.

11/08/2012

Quenturas

Virão
Tardes quentes de inverno,
Verão.
E à sombra da natureza morta
Repousarão os corpos nus.
O cansaço será um pretexto,
Pra construir um contexto
De prazer e comunhão,
E desvendar o ocorrido.
Até a frieza voltar
A seu devido lugar.
E quando ela voltar,
Vamos esperar um novo calor,
Um novo amor,
Que esquente a alma
E nos faça suar.

10/08/2012

Apartamento

Há um apartamento entre nós.
E nós nunca o quisemos.
Vendemos nossa alma,
Pra não encontrar a solidão.
Mas ela está aí,
De volta de viagem,
Instalada na sala,
Estrangulando nossas saudades
E paciências.
Estou fora da casa,
Por causa do apartamento.

09/08/2012

Babá

Cuida dos filhos dos outros
E ninguém olha os seus.

Limpa os filhos dos outros
E ninguém lava os seus.

Leva os filhos dos outros
E todos levam os seus.

Alimenta os filhos dos outros
E todos se alimentam dos seus.

08/08/2012

O artista e sua obra só

Artista de uma obra só,
De uma vida só,
Composta de muitas pinturas,
Muitas frases (e fases).
E poucos entendem
Seus muitos sentidos,
Suas múltiplas faces.
Ele vai morrer só.
Melhor!

07/08/2012

Ethos de classe

Tenho toda indignação contida da classe
Operária da vida.
E só me descontrolo em casa (de ferreira)
Com espeto de pau.
Precisava fazer rock,
Mas só faço sambar.
Tenho o molejo da cintura esguia de cada dia
De muita batida
E pouca folia.
E sigo enganando(-me).
Precisava contestar,
Mandar tudo parar,
Mas só sei lamentar
E achar que um dia será diferente,
Serei contente.
......................................
Desenho de Carybé.

06/08/2012

Magrela

Minha magrela se foi.
Dei duro para tê-la comigo,
Mas ela se foi.
Foi roubada de mim.
E nem cheguei a curti-la direito.
Paguei um preço alto por ela,
Mas alguém a levou pra longe de mim.
Quando se é assaltado
A raiva nos paralisa e corroi.
E os pensamentos matam mais que as (re)ações.
Mas depois a gente acostuma com a dor
E a saudade vem.
Por fim, torço para que esteja bem,
Mesmo longe de quem a idealizou,
De quem a montou.
Espero que alguém cuide bem dela.
E vivo esperando encontrá-la rodando por aí,
Passando na rua por mim.
Melhor cuidar de mim.

05/08/2012

Voltas

Quando você se acha,
Você me perde (de vista).
E eu também me perco
Sem você.
E se alguém me perguntar por onde ando,
Direi que ando torto,
Perdido por aí,
Sem sossego
Nem razão.
Ah, se a vista cansada não fosse programada!...
Enxergaria eu longe (de você),
Perto do coração,
Na rua da saudade,
Número qualquer,
Desde que nos faça rir sem parar.
Um número que caiba em nós
Dois,
Que fique apertado
Como nosso abraço.
E que nos lembre que a saudade é só o motivo pra voltar.
Há voltas e voltas:
Há aquelas que rodeiam (o amor);
E aquelas que retornam (mesmo sem querer).
Mas também há aquelas voltas enganadoras,
Que não afetam quando não se descobre (a nudez castigada),
Que chamamos de pernadas.
E eu que ando sem pernas,
Sigo (desejando) suas marcas,
Gosto de suas pegadas.
E me pego querendo mais que pisar no rastro de sua sola:
Quero dar voltas na sua cintura
E buscar o que há em mim de você.
Memórias retornam.
E meu amor, quem sabe?
Só me deixa sonhar!

04/08/2012

Em memória

Ah, memória torturante,
Da boa e velha senhora,
Que me enche de gozo!
Quando ela vier me assaltar,
Que me pegue pelado e armado.
Pra não haver ilusão de uma causa perdida
Em meio à multidão de olhares desatentos.

03/08/2012

Anulação é ilusão de amor

Anulo-me pra não anular você.
Nem sei dizer o que se passa em mim
Pra tanto desamor,
Pra tamanha auto-penitência.


Nem sempre se é o que parece,
Mas se anular é sempre indecente
E (contraditoriamente) resistente.

Já que você nunca vai poder sonhar sem idealizar
(Até sonhar é limitado),
Por que não viver de ilusão?
Anular-se é ilusionismo do bem
Que não quer mal me quer.

02/08/2012

Andei buscando (e achei) você

Andei buscando saber
O que não sei.
Andei buscando saber,
Mas cansei.
Andei buscando parar,
Mas a vontade não me deixa
Descansar
De você!
Andei,
Busquei,
Mas nada achei,
Além de você.
_________________________________________
O que há atrás da porta vermelha do seu peito?

01/08/2012

Da lua a metade inteira(mente) desequilibrada por mim

Somos de lua
cheia (de encanto).
Fujo para o meu canto
e você me agarra,
me amarra
junto a vc,
com laços embolados,
abraços apertados,
sorrisos entortados
e olhares cheios de nós.
Como é bom sentir seu corpo
no meu suor
e deitar ao lado de mim.
Não até o fim,
mas até a proxima cheia
da lua que nos rodeia
e nos atrai.