07/11/2010

Desempenho e frustrações

Um intelectual de tradição marxista chamado Guy Débord publicou no final da década de 1950 o livro "Sociedade do Espetáculo", em que criticava as transformações do capitalismo tornando tudo em espetáculo para consumo. A sociedade americana, sociedade do espetáculo por excelência, usa a expressão standing ovation para designar um ritual de aplausos prolongados e de pé (numa expressão de reverência) que se destina a grandes personalidades. Quem já presenciou uma cena como essa não pode negar que seja emocionante. Talvez uma dessas homenagens mais emocionantes tenha sido a despedida de Magic Johnson das quadras de basquete, quando descobriu ser portador do vírus HIV.
Mas o contexto da fragmentação das relações sociais e atomização dos indivíduos em que vivemos alimenta essa nossa carência coletiva por reconhecimento (aplausos) numa sociedade onde a indiferença reina. Por esse motivo, pela busca do reconhecimento, acabamos dando cabo a uma sociedade do desempenho. Mas trata-se de um desempenho apartado de seu sentido de uso, quer dizer, sem levar em consideração o bom desenvolvimento de uma atividade, qualquer que seja ela.
Estamos exageradamente preocupados com nossos desempenhos, mas de uma perspectiva egoísta e alienada: queremos desempenhar bem nosso papel, visando os aplausos, o reconhecimento, e não necessariamente a boa execução de uma atividade. Isso significa que estamos mais preocupados com o fim (reconhecimento) do que com o meio (boa execução de uma atividade). Aí passamos a desempenhar bem em todas as áreas da vida, do sexo à atividade profissional, passando pela religiosidade e a paternidade/maternidade.
Hoje em dia o vazio existencial é tão grande que desempenhamos com maestria nossos papéis para receber elogios e aplausos. Prova disso é que quando esse reconhecimento não vem, nos sentimos amargurados, magoados, deprimidos ou irritados. Ou tudo junto. Isso significa que o sentido da existência tem cada vez mais sido colocado no outro. E como vivemos, paradoxalmente, numa sociedade egoísta, essa atitude acaba gerando muitas frustrações, porque queremos reconhecimento pessoal mas não estamos dispostos a reconhecer o bom desempenho do outro. Isso também é um problema social.