21/08/2011

Degradar é natural

A natureza é assim:
selvagem.
Eu também.
Minha natureza está,
naturalmente,
dispersa,
sem pressa.
Caço pra comer,
pra viver.
E degrado minha natureza,
sua beleza,
com toda certeza
de que tem de ser assim.
Pior pra mim.
Minha natureza morta,
esse espaço vazio,
que nunca é preenchido,
parece feito pra mim,
feito por mim,
com toda sutileza
e maldade:
vou secando os rios
e molhando os olhos;
vou queimando a mata
e o mato;
vou buscando a carne
onde ela está,
em qualqer lugar.
E sigo meu instinto,
sigo intestino,
cruel.
Cruel é a ordem!
Já a desordem liberta
o mal que há em mim
e marca meu rastro
de sangue
e azeite;
e marca meu rosto
de sulcos
e óleo de peroba.
Essa minha cara de pau
é de madeira de demolição,
mas o pau na cara
é desejo e obssessão.
Derrubo mitos
e florestas,
destruindo meu (nosso)
habitat,
nossa cadeia produtiva.
E quando tudo acabar,
vou comer terra
pra compensar
o mal que fiz aqui.
E vou dispersar por aí,
em algumas memórias,
em algumas lembranças.
Vou virar móvel
mobilizado por você,
mesmo sem querer,
pra seu prazer.
E a floresta não mais existirá,
nem eu.
Só restos de nós
insepultos por aí.
Pra quem quiser encontrar,
quem puder reciclar.
Renovar.
A vida perece,
ela merece.