28/02/2007

Emprego e aconchego


Estive pensando sobre a importância do trabalho na vida de um indivíduo. Alguns autores, mais recentemente, vêm discutindo a centralidade do trabalho numa sociedade sem trabalho. Estes autores apontam para a necessidade de se reduzir a importância das relações de trabalho nos dias de hoje, alegando que é exagerado atribuir tanta importância a um aspecto da vida que está cada vez mais escasso. Pode ser que eles tenham razão, que numa sociedade em que o desemprego é gritante e gigante, o trabalho deva ficar para segundo plano. Talvez devessemos mesmo nos preocupar mais com o desemprego, e com as consequências dele para a sociedade e o indivíduo. Mas este tipo de preocupação (com o desemprego) já aponta, de novo, para o fato de que o trabalho é tema central ainda em nossas sociedades e em nossas vidas. Se o trabalho não fosse tão central ainda, não nos preocuparíamos com a falta dele.
Ao contrário do que alguns velhos marxistas pensavam, o trabalho não traz benefícios só econômicos para o indivíduo. Traz também, e este é um aspecto fundamental do trabalho, a identificação do indivíduo com uma instituição ou um time. Trabalhar é também identificar-se e diferenciar-se. Identificar-se com seus pares, seus iguais, outros profissionais da empresa em que se trabalha ou com outros profissionais da área. Mas é também um diferenciar-se, que é o outro lado da identificação, dos outros profissionais da mesma empresa ou de outras ou até daqueles que não estão empregados.
Comparo o emprego ao aconchego dos braços maternos. Acolhido nos braços da mãe, o filho se sente protegido, amparado e motivado. O emprego deixa o trabalhador acolhido, satisfeito por ter uma identidade (profissional e social). O desemprego, por outro lado, deixa o trabalhador desprotegido, solitário, angustiado e temeroso. Uma das maiores tragédias que a falta de emprego pode causar não é de ordem econômica, é de ordem identitária. O desempregado se sente de fora de um sistema que valoriza os que estão de dentro, os que estão empregados, os que são "produtivos", para usar uma palavra mais apropriada. O trabalhador sem emprego luta todo dia com sua auto-estima, que teima em querer compará-lo com os empregados e inferiorizá-lo. Ou tenta fazê-lo saudosista do tempo em que estava empregado, mesmo que mal empregado. O problema é social, a falta de emprego, mas ele é sentido individualmente, na cabeça, no bolso e na barriga do desempregado. Eu sei disso.