15/03/2007
Desterritorialização
Moro numa casa com quintal. No quintal há grama esmeralda, arbustos e plantinhas floríferas: coqueirinhos, azaléias, orquídeas, hortência e outras plantinhas. Moramos aqui há pouco tempo. É a primeira vez que moro em casa. O clima da cidade é ameno. Antes morávamos num apartamento, num lugar mais quente. Mas sempre tivemos plantinhas domésticas na sala de estar.
Quando mudamos para cá trouxemos nossas plantinhas de vaso. E como havia espaço no jardim, resolvemos plantar algumas no chão. Das plantas que já existiam no jardim, deixamos algumas onde estavam, trocamos outras de lugar e algumas jogamos fora. Compramos também algumas novas plantas para o jardim. Quero falar da experiência da mudança.
Foi uma surpresa perceber que algumas plantas que estavam no vasinho morreram quando foram plantadas no chão. Outras murcharam, secaram, mas, ao fim, resistiram e já florescem. A hortência estava há anos no mesmo lugar, no meio do terreno, reinando absoluta, com raízes profundas. Achamos melhor traze-la mais para frente do quintal para valorizá-la e ao jardim. Ela também murchou, perdeu as folhas, pensamos até que havia morrido, mas está lá, firme. Só falta florir. Mas ainda não está no tempo.
Não é fácil sair de um lugar para o outro. Não é simples: sair de um território para outro é mais do que um deslocamento. É um processo de desterritorialização, uma tentativa de se enquadrar nos novos modelos culturais do lugar de destino. O brasileiro não é igual em todo lugar, nem poderia ser igual também a sua cultura. Somos uma sociedade multicultural.
Desterritorializar é perder a segurança gerada pelas raízes fincadas no solo há tanto tempo para tentar enraizar-se em outros solos. Gera medo, insegurança, angústia. Somos excluídos, perseguidos, humilhados. Como as plantinhas trocadas de lugar, murchamos, definhamos e morremos. Ou resistimos.
Milton Santos, no livro “Espaço do cidadão”, diz que “a cultura, forma de comunicação do indivíduo e do grupo com o universo, é uma herança, mas também um reaprendizado das relações profundas entre o homem e seu meio, um resultado obtido através do próprio processo de viver. (...) a cultura é o que nos dá a consciência de pertencer a um grupo, do qual é o cimento. É por isso que as migrações agridem o indivíduo, roubando-lhe parte do ser, obrigando-o a uma nova e dura adaptação em seu novo lugar. Desterritorialização é freqüentemente uma palavra para significar alienação, estranhamento, que são, também, desculturização”.
É f***!